A louca das casas
Eu
sou a louca das casas. Caminho pelas ruas, observando as casas bonitas. Passei
a infância morando em casa com varanda e fundos. Foi só aos 9 anos de idade que
migrei para os bloquinhos. Mas de prima percebi que ser guria de apartamento
não trazia vantagens.
Logo,
desenvolvi uma paixão por casas; aquelas bem grande para dar conta de toda a
família, de segunda à domingo, e em dias de aniversários.
Mas
hoje é tudo tão diferente... Elas são todas gradeadas. E mesmo assim, ninguém
parece curtir os espaços ao ar livre, o pátio ou “a frente” ajardinada.
Ao
fundo de alguma janela, dá para ver que tem gente em casa. Às vezes... Tem
sombras perceptíveis formadas pela luz tênue de algum abajur – luminárias para
os elegantes.
Não
ouço vozes, nem de crianças brincando. Não tem entra e sai. Não tem frestas
abertas para ventilar os ambientes.
É
tudo muito esteticamente insípido. E, claro, inodoro. Ao meio dia, meia tarde
ou à noite, não há aroma de comida caseira. Não há cheiro de nada. Nem de
detergentes, mesmo que tudo esteja sempre muito limpo. Inclusive, deve ser a Sheila,
da Caverna do Dragão, que faz a faxina nessas casas, usando seu manto invisível...
Talvez
não vivam pessoas por lá. São zumbis modernosos, veganos, que se alimentam de
sol e sejam politicamente corretos. Do tipo que separam o lixo seco do
orgânico, mas não saibam distinguir os diversos resíduos. Mas nas datas e
horários, as sacolas se materializam nas calçadas para o descarte.
Vida
mágica essa do século XXI. E eu que pensava que nossa tecnologia era atrasada.
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